quinta-feira, março 09, 2006

TALVEZ




"Não gosto é quando pingam limão nas minhas profundezas e fazem com que me contorça toda. Os fatos da vida são o limão na ostra?"

( Clarice Lispector_ "Água Viva"pág.36)

O post de hoje segue aí embaixo...






Acordei terrivelmente ácida,melancólica, precisando intimamente de colo e de alguma mordomia emocional...Uma sensação de fracasso, de estar esperando, esperando pela coisa errada;esperando ser salva pela palavra, tentando me equilibrar em cima de uma caneta bic...Sei lá, tem muita coisa misturada.
Esse texto foi escrito há alguns anos e escolhi postá-lo aqui porque nenhum outro descreveria tão bem o meu desconforto de hoje.Ele é longo, mas é fluido.Vcs podem começar a ler hoje pra terminar no domingo...rs.






TALVEZ

... Talvez a verdadeira intimidade eu só tenha buscado com as palavras. E eu me entupi delas no momento em que poderia estar aprendendo alguma coisa com alguém. Talvez eu aprenda a ser mais silenciosa; a usar palavras menos aflitas, a falar mais com o olhar. Porque me entupindo de palavras eu me defendo cuspindo-as em alguém que tente uma aproximação.

Faço um muro de palavras entre mim e as pessoas. Sou autoexplicativa só pra confundir.

Talvez eu tenha nascido para uma vida desapaixonada e culta. Talvez eu nunca tenha olhado verdadeiramente o outro; e só tenha visto o texto pronto que criei acreditando nele. Talvez eu não conheça o que julgava ter acesso cognitivo. E isso me entupiu de certezas que eu não soube abandonar ao longo do caminho.

Uso palavras para não sofrer, para plagiar uma dor, pra fingir que sou leve e que está tudo bem. Uso palavras pra falar de uma chuva que talvez eu não conheça porque não me permiti ficar encharcada dela. E ela virou a metáfora de um relacionamento_ o que pode ser tristemente poético.

Talvez eu só tenha sentido saudade pra falar de outras coisas. Pra usar a palavra "saudade" mesmo, que eu adoro. Acho que estou muito cansada. Falei demais das coisas e , no entanto, não toquei verdadeiramente em nada. Observei e descrevi, cheia de filtros semânticos. Dentro da minha limitação eu interpretei o Universo para que eu coubesse nele, em mim. E alienei as pessoas dentro de conceitos. E arranjei um sentimento pra cada coisa. E pensei que assim, tudo estaria em ordem, sob controle.

Eu que me julgava não julgadora, me considerava livre, agora tendo que empurrar as grades dessa prisão de certezas que criei pra mim. Sem poder culpar ninguém. Usando um discurso de alguém que não quer magoar o outro pra descobrir que no fundo só me importei comigo mesma e com os meus medos. Não deixei que o outro experimentasse o que havia de melhor ou de pior em mim. Não deixei que ele escolhesse.Mantive o muro de palavras e o meu discurso pronto pra continuar a salvo do outro lado. Eu que sempre falei de pontes...

Talvez eu seja uma farsa. Talvez eu seja virtualmente inacessível. Alguém que se entope de adjetivos pra entender as coisas e dizer que não se preocupa em entender nada. Eu que sempre falei de amor, não amei o outro em toda a dimensão da pessoa que ele é. Talvez eu tenha me preocupado mais com as vírgulas que não usei nas cartas de amor que escrevi que com as pessoas que as receberam e que se julgaram amadas. Talvez eu só tenha dançado pra fingir que gostava de música. Talvez eu só tenha bebido pra fazer parte de um círculo social. Talvez eu só tenha aceitado certas coisas pra poder ser chamada de amiga_ e usei levianamente a palavra amizade.Talvez eu tenha me apaixonado diversas vezes pra fazer parte do círculo de pessoas que sorriem diferente porque estão amando_ e sofri as carências que intercalam as paixões como se fossem reais. Talvez eu tenha rompido relações pra escrever cartas de despedida e mostrar como eu dominava a dor ao escrevê-la. Talvez eu só tenha experimentado as relações dentro da literatura.

Acho que estou realmente cansada. Falei demais sobre tudo e continuo no escuro. E a minha recusa em tocar nas coisas me impede de sair tateando em direção à luz. E mais uma vez eu uso palavras pra tentar me defender de algo, de mim.Talvez eu precise parar de ler Clarice Lispector... Talvez eu devesse escrever uma carta em branco pra dizer que quero silenciar: que se o silêncio ainda estiver esperando por mim, eu aceito. Preciso esquecer as palavras, preciso me despedir delas para começar a experimentar a vida com honestidade. Talvez silenciando eu consiga ser mais honesta com você. Eu que precisei escrever tanto pra dizer isto: que preciso silenciar.

Talvez eu só tenha escrito isso tudo pra conseguir chorar... E usar a palavra "talvez" pode ser o início do abandono de tantas certezas; o início do uso mais corriqueiro da frase “eu não sei".

Talvez isso seja um começo de alguma coisa;
Talvez isso seja um fim.
Talvez sejam apenas hormônios do período menstrual...
Mas isso tudo se parece muito com tristeza...
EU NÃO SEI.


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( E no meio desse incômodo todo, recebi um afago,um buquê de elogios...Está aqui: http://brunomarks.blogspot.com/
Bruno querido, vc sabe da eternidade tatuada no que vivemos juntos..."Coisas que só o coração pode entender!"Amo vc.)

9 comentários:

Anônimo disse...

Vc nunca vai conseguir ficar sem palavras... Já são condição intrínsecamente humana... Talvez você devesse... Talvez você precisasse...
Talvez você pudesse...
Talvez você quisesse...
Talvez é só uma possibilidade no meio de tantas outras, quem sabe?
Eu particularmente não gosto de talvez... Lembra-me qualquer coisa de dúvida e eu definitivamente não gosto de ser indecisa... Gosto de correr riscos com minhas convicções.
=)

Anônimo disse...

Primeira
XD~~

Anônimo disse...

Esqueci de dizer a famosa frase: se a vida lhe deu um limão, faça uma limonada!

Ok... eu sei, foi podre...

Kd o brigadeiro?

Anônimo disse...

Marla:

da sensibilidade das rãs

mergulhas teus olhos
no ar espesso
dos meus pulmões

troco meus talvez
pelos teus senões


bj
Nel Meirelles
http://www.falapoetica.blogger.com.br

Marques disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Marques disse...

Nossa!! ou melhor Eita. Mexi tanto assim? Não é porque você escreveu algo que eu tinha mencionado. Mas, esse foi o texto mais Marla que eu já li em seu Blog. Essas palavras realmentes são suas e também são lindas. Beijos!!!

Anônimo disse...

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Anônimo disse...

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A poesia acontece quando as palavras se abraçam...