sexta-feira, dezembro 28, 2007

Porque hoje é meu aniversário e eu completo 1.536 luas de existência...

Foto: Eu mesma por Marco Teobaldo

Sou o resultado desses amigos que tenho e do que recebo diariamente de afago, cuidado e demonstrações de afeto. É disso que sou feita: de um bocado de tanto amor.Sou resultado desses encontros, dessa magia que é meu cotidiano. Dessa minha negociação com a meteorologia pra fazer uma festa na praia e ter de presente uma lua imensa, incrível e pessoas lindas que apreciam a arte, que adoram compartilhar. Sou a protegida pelos meus Orixás. Sou minhas Meninas, meus Caboclos, meus Pajés. (SOU!) .Sou eu mesma essa gota, esse grão, uma obra eternamente inacabada: tudo é uma possibilidade de melhora, de mudança, de lapidação. Sou como as pessoas que me cercam, como essa gente que quer mudar a si mesmo pra que o mundo vibre numa freqüência mais saudável. Gente que presta atenção naquilo que não conhece porque abraça a novidade com a sabedoria de quem nunca vai querer parar de aprender: da teoria intelectual mais complexa à maneira mais criativa de improvisar um cinzeiro.Eu sou essa gente que se dói inteira porque não vive só na superfície das coisas. E que, por conviver mais profundamente com as angústias, são os primeiros a experimentar o êxtase de um dia de sol ou de chuva, de qualquer coisa aparentemente simples. Gente que sabe que viver com simplicidade é a coisa mais complexa que existe... e a mais sábia.
Eu posso ser qualquer coisa que me digam que eu seja porque assim me vêem, porque também sei que tudo é transitório, que tudo é movimento e possibilidade de alguma coisa. Estou apta para me deixar interpretar, mas não para rótulos. Qualquer pessoa que me pense algo, por pensar já perde qualquer coisa que me congele numa imagem... Mesmo quando dizem: tu és poeta. Poesia é fluidez.Sou o que estou e, isto sim, é perpétuo.

Talvez eu seja uma escolha quando todos os caminhos resolveram mudar de lugar só porque ela já foi feita...Mas eu celebro o mistério.
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Marla de Queiroz

segunda-feira, dezembro 17, 2007

Amistosidade



Foto: Maria Flores



Porque você enterneceu uma noite tão escura com tua voz mansa e teu jeito de entender dramas. E fez uma melodia pro meu poema mais desamparado: tudo era rascunho de alguma coisa fria até você agasalhá-lo...E me explicou porque não fomos tudo aquilo que poderíamos ter sido: naquele momento eu também não estava pronta. Mas me surpreendeu quando não propôs nenhuma mudança brusca e expôs com tanta honestidade a negligência que veio do teu medo: pela primeira vez não havia maquiagem em teu discurso.

O que acontece é que o tempo se apossou do que havia. (Foi quando pude te explicar que as minhas expectativas não eram exigências). Hoje em dia, depois de tanta história não acontecida, sobrou amizade, saudade, respeito. Já que fomos tão inábeis para o amor, restou enfim, essa ternura encabulada e nossas conversas pela madrugada numa hora em que a saudade nos constrói as frases com todos os adjetivos mais suaves para não espantar o sono. E a consciência de que não há mais tempo para usufruir o que não foi aproveitado a tempo. (Por isso choramos apenas por dentro sem deixar que nossa voz denuncie nosso olhar raso de esperas intactas). Por isso tanta doçura nas palavras pra não ferir ainda mais essa melodia frágil e cheia de melancolia. E essa tentativa de que o abraço, apenas escrito, tenha outras formas de tocar. Porque queríamos a mesma coisa, exatamente o que nos faltava e que não soubemos porque não tínhamos para dar.


Seguimos, ainda assim, unidos_ não por sentirmos o mesmo amor, mas por compartilharmos aquela mesma solidão.

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Marla de Queiroz

terça-feira, dezembro 11, 2007

Carta sem remetente



Foto: Paulo César


Gotas de som compõem uma canção de chuva. Veja meu amor, que as coisas não precisavam ser tão tristes. Mas meu coração aperta até quando danço. Porque você me garantiu que longe era um lugar que não existia e agora aqui tudo é espera e fome.Tudo é sede de alguma voz e de palavras de encontro.É que esse silêncio denso não me explica distâncias...ou talvez seja ele que nos afaste ao ponto de nem haver mais eco.
Sabe meu amor, ontem eu lembrei de você quando a previsão era de tempestades e as temperaturas ainda estavam tão altas.O ar pesado e o calor ofensivo.E havia um poema oco e insônia e falta de abraço.

(Minha poesia anda miserável e minhas cartas sem remetentes).

E quando pensei que pudesse começar a me divertir, todos foram embora da festa:eu fiquei sozinha olhando a desordem.
Sabe meu amor, sobrou apenas o meu copo vazio, taças quebradas e restos que não se aproveita mais. E depois, essas gotas de chuva que pretendem compor nenhuma canção.

Meu amor, se longe é um lugar que não existe como você me explica essa distância?

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Marla de Queiroz

terça-feira, dezembro 04, 2007

Extravios



Juliana Ferraz

Eu te agradeço por esse afastamento lento e gradual e pela viagem interrompida por seus perpétuos atrasos causados pelo medo de tirar os pés do chão. Agora, a cada dia eu preciso de uma roupa nova desde que minhas malas foram extraviadas para sempre com todo o nosso excesso de bagagem.
Eu te agradeço pela honestidade da sua omissão tão previsível que sempre confundi com meus presságios. Essa ida sem despedida que você covardeou: eu finjo que não sei, você finge que não foi.E a gente segue inventando que ainda se interessa pelo que começamos a construir juntos, num outro contexto, pra realçar nossos vínculos.

Eu te agradeço a descoberta de que se não seguimos juntos nessas coisas do amor,
seja porque talvez
eu, veterana
enquanto
você ama-dor.

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Marla de Queiroz

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