sexta-feira, setembro 21, 2012

No mais, não mais.




É porque você se acostumou com o afeto que tenho pelos meus amigos e imaginou que quando eu estivesse com você não seria áspera em momento algum. Mas acho que se a poeta se fundiu com a pessoa em sua cabeça, você não estava totalmente errado, mas esqueceu de ler algum texto em que falo da minha incoerência e das minhas fúrias súbitas. Sim, eu sou muito dura às vezes e separo muito bem amor de sexo. Não acredito que ofegâncias sejam indícios de paixões, desculpe. E me irritou você se apaixonar por exatamente o que viu em mim, por esta nudez exposta aqui e, depois ficar ditando como eu deveria agir, posto que a sua sensibilidade é exacerbada demais para as minhas ironias. O que adiantaria dizer que eu estava apenas brincando se você perde todo o senso de humor para se magoar e ficar rancoroso para o resto da vida? Penso como deve ser pesado aprisionar na lembrança tantos defeitos pessoais que não sejam seus, carregar as pessoas nas costas (imaginariamente) para depois devanear sobre alguma vingancinha pueril.
Então deixa eu te contar uma coisa: eu sou coberta de defeitos. Eu sou a pessoa mais estranha que conheço. E a mais amorosa também. Mas me posiciono acidamente quando me sinto invadida: eu não sou fofa, meiga ou doce. Não me preocupo com o que pensam de mim, mas se estou sendo justa e sincera. Eu prezo pela transparência e não seduzo levianamente. Talvez este meu modo de agir e de deixar tudo às claras tenha te decepcionado. Infelizmente, isto não me incomoda de maneira alguma, porque acho que fiz o que deveria ser feito. Mas eu nem sempre estou certa. Eu não tenho a pretensão de estar sempre certa. Eu nem acredito em certezas, acho.
No mais, você é alguém que eu indicaria para as minhas amigas mais “meigas”, mas o teu lado “chateado-com-o-tom-do-seu-bom-dia” não me comove, incomoda. A minha suposta esquizofrenia pode não ser um defeito, mas minha característica. Você esqueceu que sou humana demais mesmo quando, emocionado, leu “Poema em Linha Reta” do Fernando Pessoa dizendo que estava farto de semideuses. Sou “a gente deste mundo”. Sou disponível, mortal, na maioria das vezes indiscreta e exageradamente espontânea. Eu não sou convencional. E gosto de homens que bancam esta excentricidade. Descobriu onde acabou a nossa eletricidade? Então fiquemos por aqui. Impossível continuar tateando no escuro em busca de alguma saída. Não agora. Eu tenho um par de asas: existe um céu imenso... lá fora.
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Marla de Queiroz

terça-feira, setembro 11, 2012

Parem tudo!


Voltando para casa depois de um dia, mais um dia. Parem tudo! A noite nasceu e as estrelas se exibem no céu. Os carros transitam normalmente e as pessoas olham para o chão! Parem tudo! Existe alguém morrendo de saudade num quarto qualquer.
Existe alguém tendo o melhor orgasmo da sua vida no chão de uma sala comum. Existem Alguéns. Parem tudo! O dia acabou, mas o tempo continua sua jornada, mais uma ruga nas horas do relógio inventado, mais uma cicatriz na lembrança da história quase acabada. Parem tudo! Um amor principia com um simples tocar de ombros no metrô. Uma semente abraçada por um solo fértil se prepara para virar flor. Parem tudo! Uma pessoa em fase terminal acaba de se curar! Uma estrela riscou o breu, mas não caiu no mar. Parem tudo! Guardem um pensamento bom, toquem nisto que é tão abstrato, mas que chamamos de vida e durmam tranquilos com aquela esperança de ter mais que este momento, de poder dormir e acordar!
Parem tudo, ainda é hoje! Temos apenas este agora! Vamos nos abraçar?

Marla de Queiroz

segunda-feira, setembro 10, 2012

AINDA


Ainda arfa o peito, a lembrança intensa da tua boca úmida em meu seio. Ainda pulsa quente, teu apetite penetrando a fome do meu ventre. Ainda o teu cheiro em meus cabelos, tua mordida em meu pescoço. Ainda o teu olhar no meu, nossa saudade escandalosa, a eternidade do beijo que vai durar pra sempre... agora. Ainda tua risada da minha gargalhada, a piada sem graça, este estado de graça, o bem-estar de estarmos juntos. E este enrosco espalhando digitais por todo o corpo. Ainda estas vontades sem freios porque são teus meus anseios. Ainda este sussurro gostoso, ao pé do ouvido, depois do gozo. Ainda o mundo lá fora, o vento levando a cidade embora e o nosso passeio no espaço... sem tempo. Ainda é meu, seu, nosso este momento.

Marla de Queiroz