sábado, junho 29, 2013

Sem recalques




As minhas entregas são definitivas no agora para sempre hoje. Não me importa o seu medo, teus motivos, tuas fugas. Eu me entorno no que faço, viro a coisa inteira, não tomo a atitude, me torno a própria. Eu não escolhi a minha intensidade, ela veio com muita personalidade e uma quase autonomia. Não pretendo o gozo, busco o Nirvana. Sou flexível ou radical por uma questão de experiência. Eu sobrevivo às frustrações e me responsabilizo pelas minhas desistências. A minha adaptabilidade foi conquistada através de uma profunda reflexão, o que não quer dizer que eu aja por conveniência se não estiver em consonância com a minha essência. Pode parecer arrogância: tantas coisas se parecem com o que não são. Não abrevio minhas emoções, não interrompo meus desejos, sou objetiva nas minhas querências. Não banalizo minhas angústias e sofro como qualquer ser humano por questões tão corriqueiras como rejeição e todas estas coisas que nos fazem olhar para a vida, por um instante, com certo cansaço e desânimo. Mas corro os riscos e banco a minha história, pois a escrevo e reescrevo quantas vezes for preciso. 


Por isso, antes de me julgar, faça as pazes contigo.

Marla de Queiroz

quinta-feira, junho 13, 2013

Carta para M.


Meu querido M.,

Estou tão cansada. Estou tão, tão cansada! Minha vida tem sido um amontoado de palavras, M. Quase não falo, mas escrevo tudo o que não escrevi durante toda a minha existência. E tenho refletido sobre esta relação obsessiva que o escritor tem com a palavra. Pois, apesar da minha profunda necessidade dela, sua aproximação é muito tímida às vezes, e fico com todos os meus sentimentos desamparados de frases. Apenas sentir, sentir, sentir demais me entorpece, instiga minha insanidade e provoca uma profusão de diálogos e monólogos absurdos dentro de mim. Será que alguém repensa a própria existência e vive este processo de mergulhos até perder o fôlego intencionando respirar, por um segundo que seja, na superfície das coisas?

M., eventualmente, tenho tido algumas crises de ausência e minhas tentativas de dizer coisas soam vãs, pois nada escuto ou vejo. Mas estou condicionada a estimular minha mente e eu não me dou este instante de paz. Tiro o meu coração da garganta e pergunto o que ele tem a me dizer. Mas B. não quer apenas minhas palavras, B. quer minha presença, e tenho estado tão indisponível para me relacionar com algo que não seja um texto. Um livro. Centenas de livros espalhados pela cama antes de dormir. De tentar dormir.

Centenas de abas do Word abertas com frases desalinhavadas em cada um delas. “Deseja salvar as alterações?" Sim, não, talvez, não sei, será?. Confusa, confusa como nunca estive. E tão povoada e só. Absurdamente só com todas estas pessoas que moram em mim. Com todas estas cores e paisagens e sensações e metáforas e músicas e aquele filme que nunca mais consegui parar de assistir porque demorei tanto para conseguir assisti-lo e eu estava tão entranhada naquele roteiro que fui minha espectadora por duas horas. Tive duas horas de eternidade, M. E, agora, Roberto Carlos me dando um nó no peito. Uma vontade de chorar de cansaço e B. querendo me dar colo e eu recusando porque preciso escrever. Roberto Carlos me diz “eu me vi tão só...” e eu choro, choro e B. tenta abraçar minha confusão. Mas ela é minha, B. não merece minha confusão. E “eu me vi tão só, enfrentando momentos difíceis de solidão...”, Roberto Carlos parece saber bem o que é isso. E, por enquanto, estou salva. Reze por mim,M. (Eu precisava estar dormindo agora mas estou escrevendo para você).

Então, apenas me abrace em pensamento enquanto eu choro.
Sinto sua falta,

Marla de Queiroz 

terça-feira, junho 04, 2013

B. de AMOR!



Hoje, pela primeira vez eu chamei B. de MEU AMOR. Foi tão espontâneo que nos espantamos simultaneamente, mas depois o sorriso dele foi se alargando até encostar no meu.

Nunca voltei mais cedo para casa por causa de B., mas hoje eu tive muita vontade de encompridar o nosso tempo juntos: sempre tão descontinuado pela crueldade de um despertador que nos desabraça na hora mais delicada do nosso chamego.

B. nunca foi insistente ou invasivo. B. não quer namorar a poeta, B. me trata como musa e aprecia o que escrevo, ele quer namorar o ser humano inteiro. Ele me olha como pessoa: e nisto percebe todas as minhas fragilidades e as palavras que o meu silêncio mastigou. Conhece minha mandíbula trincada de raiva, minhas infantilidades, o meu ego atuando, e um jeito independente demais que, ele sabe, é pura autodefesa.

B. me desmorona com sua maturidade de chegar junto, de bancar a história, de saber calar quando me altero e de ser assertivo quando se sabe inofensivo. B. não discute, vai embora e volta para me dar tempo de reavaliar minha impetuosidade e de autoanalisar minhas palavras cuspidas. Ele volta quando o meu abraço é sincero, imaculado.

Mas ele faz isso apenas porque nos continuamos sem subtrações. Somos tão lúdicos juntos e o que nos agregamos com a especialidade de cada um é ímpar. Nossa troca é justa, é pura, é deliciosamente nossa. Nosso “estar junto” é um bem-estar único.

Hoje, pela primeira vez, eu chamei B. de MEU AMOR. E, nós sabemos, foi isso que ele se tornou.

Marla de Queiroz