quinta-feira, dezembro 04, 2008

Bachelariando sobre o barro...

Foto: Cristina Afonso

O texto abaixo eu escrevi para minha amiga Tayira, arteterapeuta que está escrevendo sua tese sobre o barro.Ele é resultado das nossas conversas de uma semana inteira sobre o amor, arrumações de guarda-roupa, barro, contradições,crises existenciais, Bachelard...Compartilho com vocês.
P.S.: Desculpem a demora de atualização do blog. Estou escrevendo minha monografia e resolvendo as últimas questões do lançamento do meu livro. Em breve, a divulgação oficial aqui, mas posso adiantar que será dia 16/12/08.

*


Porque deveria ser proibido esses domingos ensopados pela chuva e, por dentro, tanto frio sem esperança de alguma nódoa de sol. Deveria ser proibido mãos que não alcançam um pedaço de argila e um punhado de água pra amolecer a dureza que têm as ausências, as carências, o concreto de alguns corações.
Deveria ser proibido no meio da dor, só a lembrança das ondas que explodiram pra promover um beijo: era a maior doação da natureza pra afagar olhares que procuram e procuram_ e que olham para os lados sem ver o que ao lado está. (Que nem Clarice explicou em “ Por não estarem distraídos”).
Minhas mãos em concha seguram tantos gritos, líquidos.Mas tenho medo de acordar os que se estabeleceram uma rotina sem qualquer possibilidade de desconfortos fora dos calculados.

(É quando a magia ganha a obrigação de ser um amparo alheio).
Eu andei pensando sobre o barro, sobre o amor, sobre vestidos que viram saias e saias que viram blusas. Eu andei pensando que, às vezes, a gente gostaria de enfiar a pessoa que a gente ama dentro daquela gaveta arrumada pra só saber dela quando abrisse o guarda-roupa no auge da vontade de se enfeitar de sentimento.
Andei pensando nesse coração de argila que se molda de artérias entupidas pelo amor.
(ainda é preciso esperar que seque rápido e torcer para que não tenha sido feito frágil demais.)

Eu andei pensando nesse movimento de mãos que se vestem de areia, que fazem círculos enquanto contam sobre o eterno retorno do mesmo. Sobre a lucidez da loucura.
Você espera que a terra te dê chão? A terra, sem a água, sem o ar, sem o fogo, só pode te dar a impossibilidade de vôos, às vezes.
Talvez estejamos tentando fazer barro com areia e água salgada. Mas o barro quer da gente é doçura.
Andei pensando nessas esculturas de sal.Isso não pode ser a nossa obra-prima.
O amor não pode ser engessado. Ele não pode ser estático.Amor não pode ser chão de ninguém.Amor nasceu para dar asas.

Quando você me contou que havia um abismo no seu peito, um buraco no seu coração, eu tentei visualizar abismos e buracos...E vi muito coração dentro deles.
(Um outro ângulo.)

*

Marla de Queiroz

12 comentários:

Pâmela S. Melo disse...

"O amor não pode ser engessado. Ele não pode ser estático.Amor não pode ser chão de ninguém.Amor nasceu para dar asas."

Você dança com os sentimentos nos pêlos e os traduz na escrita...

Dicionário de emoções, tamanha é a sensibilidade escancarada por toda tua pele. Linda!

Fiquei Feliz pela notícia do livro. Com certeza serei uma leitora encantada pelos teus sons.

Luz e brisa!

Su. disse...

Meu Deus, e eu sem procurar, sem esperar, fiquei para sempre agarrada ás tuas palavras... revelas como sempre tudo do melhor que há em nós, e eu gosto, gosto mesmo de te ler... na realidade, admito ser uma relação um pouco egoísta, porque acabo por querer ler-te para me compreender, para me encontrar, para te sorver até á ultima letra, e quando acabo o texto, como uma criança fico á espera do próximo, vou ter sempre sede de uma arte como a tua.

Tudo de bom para o lançamento do livro, tu chegas lá, tu tem muito talento! :)

Beijo do outro lado do mar.

Gustavo Jaime disse...

Livro? Eu ouvi, digo li, bem? Que beleza! Estou sempre por cá, à espreita e espera dos seus textos maravilhosos. Adoro cada um e como você escolhe e casa as palavras. Tua sensibilidade é divina.

Nem lembro como cheguei ao teu blogue, mas nunca esqueço de visitá-lo. Parabéns!

Paixão, M. disse...

Livro? mas que MARLAvilha! Com certeza vou ter meu exemplar na minha estante (e cabeceira).

Ô, Marla... que é tão difícil pra todo mundo entender que amor tem que dar é asa... tenho aprendido bastante sobre isso. Não é fácil não esse desgarramento.

Tudo fantástico aí no texto, tudo. Ah, essas suas formas de dizer... :)

bjos!

Lubi disse...

que feliz. um livro teu.
esperando desde já.

um beijo.
e um abraço enorme, minha querida.

Junú disse...

Que belo!
Ao sentir o som das palavras escutei a melodia desenha por suas vozes soando juntas.
Não sabia que aquela danada escrevia!
Um grande beijo pra você e estamos na expectativa do lançamento. Conte com a gente pra dar uma canjinha! Será uma honra!

Anônimo disse...

A cada palavra uma sensação nova..
Como é bom reler vc,
minha loucura..

Bjos..

Anônimo disse...

Maravilhoso! Sem palavras pra dizer qq. outra coisa...

Nossa, espero ansiosa teu livro!

Grande beijo, moça!

Sou tua fã!

Cris (precisotantoaproveitarvoce.zip.net)

Anônimo disse...

Suas palavras, sempre preenhes de outras palavras, além das escritas, além das solidificadas...
Quero elas presas no papel, pra poder guardar em minha gaveta de amores, pra vestir num dia de sol.
Beijos!

aluisio martinns disse...

"Talvez estejamos tentando fazer barro com areia e água salgada. Mas o barro quer da gente é doçura."

Meu Deus! Haja Marla nessa mundo e que se cria nova religião de amar a vida das palavras.

Daniel Pearl Bezerra disse...
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Lia disse...

Lindíssimo!!!!
No duro, emocionada, muito. Mas como você tão bem disse, o barro quer da gente é doçura...
Então, no mole, né?
E , de novo, lindo!

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A poesia acontece quando as palavras se abraçam...