Dispenso a influência da angústia de Clarice Lispector por dois momentos: pra suspirar pelo amor de Riobaldo por Diadorim,(“Grande Sertão: Veredas” é a minha bíblia, Deus me perdoe)e pra escutar o Rei Roberto Carlos que me desconcerta com uma simplicidade quase dolorosa.Eu ponho o livro aberto entre as pernas e canto junto: “ quando eu te amei pela primeira vez, tudo era poesia, a juventude andava em nossos corpos, em nossa fantasia..." Você ri da minha mistura de ídolos, da mania de querer fazer tudo ao mesmo tempo e da emoção com que canto uma música que não é do Chico Buarque pra, em seguida, retomar repentinamente a leitura do trecho interrompido.Mas eu não estou sofrendo quando escuto uma música triste e choro sentida, eu sofro é por não ter escrito nada tão genial quanto Guimarães Rosa.(Ainda explico: é que eu nasci envelhecida, eu moro com a saudade).O meu humor oscila várias vezes nesse mesmo dia e eu consulto o calendário e o meu mapa astral pra saber se são hormônios ou os astros, e consulto você pra saber se sou insuportável.Talvez eu seja bipolar, eu penso, todo mundo hoje em dia é.Você sugere ver qualquer coisa na TV, prefiro descobrir o livro que ganhei do Xico Sá. Não consigo parar de ler ao folhear.Há tempos não escrevo um texto bom, reclamo pra mim mesma enquanto esvazio uma garrafa de vinho sem sucesso.Minhas emoções andam muito fragmentadas, concordo comigo mesma dando um último gole.É preciso que a música termine para que eu passe o rímel, o perfume e saia. Nesse momento só consigo fechar os olhos e soltar a voz com força, afagando o peito enfraquecido pela ansiedade.Estou esperando um telefonema há 3 horas, me antecipei pra medir o atraso.Na verdade, ainda há tempo hábil para o amor e vai ser tão melhor se só chover depois, intuo.A tempestade veio antes, você ficou preso no trânsito e vamos perder o filme, era o que eu temia. Mas eu comecei a ler um livro incrível, preciso conversar com alguém culto, rebato. Você entende com a mesma discrição da minha insistência.Você decide que vem, a qualquer hora, me acalma. Ainda temos um dvd ou conversas intermináveis, prometo. E eu torço pra que consigam remover rapidamente essa árvore que caiu obstruindo o trânsito. E rezo por dentro pra que ela não tenha sofrido muito.
*
*
Marla de Queiroz
7 comentários:
"Tudo que te cerca é a substituição de algo que não existe." Porque teu texto descreve uma situação diferente, mas lembrou o meu.
"é que eu nasci envelhecida, eu moro com a saudade", algo que li (um trecho) de Guimarães Rosa parece ser a tradução reversa disso aí que tu escreveu. Mas o ato falho me impede.
Beijos, flor.
confusa? ou eu que estou e mais fiquei ao ler isto????
"é que eu nasci envelhecida, eu moro com a saudade" eu sou assim.....
Pena que haja tanto preconceito, mas Roberto Carlos é fundamental para o coração.
Bjs,
REMO.
Ah, Marla.
De novo, conexão.
Cresci escutando Roberto Carlos porque minha mãe é daquelas fãs. Final de semana passado, depois de muito tempo, pus o dvd e fiquei cantando baixinho as músicas que todo mundo canta e pensando em como é bom sentir. SENTIR. Da forma que sentimos.
Grande sertões: veredas preciso ler. Já te vi citar tanto e a minha exacerbada curiosidade me impediria de não.
Um beijo grande, querida.
Gostei muito, Marlinha. Muito, muito. Beijos.
gosto muito dessa música do rei.
Marlindona!!!
texto muito ... muito explicito. na minha perspectiva as palavras chaves do texto é a música e a fé. A imagem mental do que queremos é o método, em toda sua amplitude.
beijos tranquilos em te lêr!!
Postar um comentário
A poesia acontece quando as palavras se abraçam...